Após mais de 50 anos de luta, comunidade do Peres, em Ubatuba, finalmente deverá receber energia elétrica

A rede de energia está a 800 metros da comunidade da praia do Peres, mas até hoje não chegou até os caiçaras; MPF tem ajudado e a prefeitura promete cobrar mais agilidade da Elektro para que energia chegue até a comunidade ainda em 2024

Por Salim Burihan

A Prefeitura de Ubatuba e a concessionária de energia Elektro realizaram uma reunião nesta semana para discutir a instalação de rede elétrica em diferentes áreas do município. Um dos principais temas abordados foi a ligação de energia na Praia do Pérez, uma comunidade isolada que há anos luta por esse serviço essencial.

Moradores da Comunidade da Praia do Peres, em Ubatuba, se reuniram em maio do a passado, com a prefeita da cidade Flávia Paschoal(Foto), servidores municipais e o vereador Rogério Frediani, para reivindicarem a agilização do processo de implantação de energia na comunidade por parte da Elektro. A comunidade aguarda há mais de 50 anos pela implantação de energia do local onde vivem cerca de 60 famílias.

De acordo com o secretário de Habitação, Claudinei Salgado, já existe um projeto aprovado para a instalação da rede elétrica na região, porém, a questão ambiental exige a averbação de uma área de compensação ambiental. A concessionária já havia apresentado um local para essa compensação, mas ele foi considerado inadequado. Agora, uma nova área foi definida e, nos próximos dias, a Elektro deve finalizar os trâmites legais no Cartório de Registro de Imóveis para dar início à instalação da rede elétrica.

Outro ponto debatido na reunião foi a definição do conceito de loteamento. A resolução da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) estipula que a concessionária deve fornecer energia para unidades isoladas, mas, em loteamentos, a responsabilidade pela rede elétrica fica a cargo do empreendedor. A Elektro tem considerado muitas áreas como loteamentos, o que dificulta a extensão da rede no município. Durante o encontro, foi levantada a necessidade de revisão desse conceito, com base na Lei 6766/1979, que trata do parcelamento do solo urbano. A Elektro se comprometeu a reavaliar internamente essa questão.

A reunião também abordou a situação de áreas tombadas pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat). A prefeitura defende que o fornecimento de energia elétrica deve ser universalizado, sem restrições a moradores dessas áreas. No entanto, toda intervenção em zonas tombadas exige licenciamento. “O município argumenta que a ligação de energia elétrica nas residências não configura intervenção, por isso, solicitamos à Elektro uma análise mais detalhada sobre o tema para que, juntos, possamos fazer a reivindicação ao Condephaat”, afirmou Salgado.

 

Luta antiga

 

O Notícias das Praias acompanha a reivindicação de energia elétrica pelos caiçaras da Praia do Peres há cerca de seis anos. A cerca de 800 metros da comunidade da praia do Peres existe postes de energia elétrica que abastecem os condomínios da praia da Lagoinha.

A comunidade cobra há muitos anos o prolongamento desta rede de energia que está a menos de 800 metros até o Peres. Os moradores dependem de gelo para manter alimentos e o peixe capturado e usa vela ou lampião à gás para iluminar as casas.

A Praia do Peres fica a 26 quilômetros do centro da cidade e a 800 metros do canto direito da Praia da Lagoinha. O acesso ao Peres é feito de barco ou por uma trilha, que, segundo os moradores, não recebe manutenção da prefeitura há muito tempo.

Existem cerca de 60 residências na Praia do Peres, metade pertence as famílias caiçaras, a outra metade, pertence aos veranistas. A falta de energia elétrica prejudica a todos, moradores e veranistas

Os veranistas utilizam geradores e placas de energia solar para ter acesso à eletricidade que mantém o funcionamento de geladeira, televisores, luzes e ar condicionado.

Segundo Thais Galbiati, uma antiga veranista, que hoje, casada com o caiçara Irineu de Oliveira, se tornou moradora da Praia do Peres, a comunidade conseguiu sensibilizar a prefeita Flávia Paschoal sobre a situação na reunião ocorrida em maio de 2024.

“É um absurdo uma comunidade viver sem energia elétrica nos dias de hoje, sendo que existe energia há menos de 1 quilômetro de distância. Basta apenas prolongar a fiação e instalar os postes. A energia elétrica é fundamental para o desenvolvimento social das famílias”, argumenta Thaís.

O caiçara Irineu de Oliveira conta que todos os dias pela manhã compra o gelo que usa para manter o alimento da família e o pescado capturado. Ele, além da pesca, mantém um cultivo de mexilhão, que ajuda a complementar a renda da família.

Antes, os moradores tinham que ir de barco até as praias da Lagoinha ou da Maranduba para comprar o gelo ou percorrer a trilha entre a Lagoinha e o Peres, carregando os sacos de gelo nas costas. Hoje, tem fornecedores que chegam de barco para vender o gelo aos moradores cobrando em média R$ 25,00 o saco.

Segundo Oliveira, os caiçaras gastam em média de R$ 600,00 a R$ 1.200,00 mensalmente apenas com a compra do gelo.  Ou seja, um custo muito elevado para as famílias que vivem da pesca.  Os moradores lembram que quem vive na cidade, mesmo, com maior consumo de energia, não gasta mais de R$ 300,00.

Quando entrevistamos Oliveira, em 2024, ele contou que muitos antigos moradores que lutaram pela implantação da energia no Peres acabaram morrendo sem ver a luz chegar na praia. Entre essas pessoas, estão seu pai, seu Constantino, falecido em 2013, aos 87 anos e seu Joãozinho(Foto), falecido em 2021, aos 75 anos.

Thaís recordou na entrevista que concedeu em maio de 2024, que há uns 20 anos atrás, representantes do Ministério das Minas e Energia teriam ido até o Peres para divulgar o programa Luz para Todos, programa de políticas públicas dos mais importantes do governo Lula, lançado em 2003.

“Eles chegaram na comunidade, distribuíram camisetas do programa e chegaram a marcar os locais onde seriam colocados os postes. “Criaram muita expectativa, mas nada foi feito até agora. Por sinal, a gente nunca recebeu a visita de um prefeito por aqui para ver de perto as nossas dificuldades”, disse Thaís.

“Quanto saco de gelo essa comunidade já carregou nos ombros por estas trilhas silenciosas? Quantas noites intranquilas de tempestades no mar sem uma luz na varanda para guiar os filhos de volta ao lar?!  E a luz ali tão perto… a menos de um quilômetro… Do lado dos condomínios há luz demais até, exageradamente iluminando suas vaidades e seus consumismos urbanos despejados em rios e praias. Afastando os peixes. Rareando as redes. Dos dois lados, há luz. No meio, a comunidade como uma ilha no escuro. Esquecida”, escreveu a caiçara Dara Oliveira, moradora do Peres, através de suas redes sociais.

Segundo Thaís, a comunidade do Peres conta com o apoio da procuradora da República, Walquiria Imamura Picoli e do promotor Wagner Giron de la Torre, da Defensoria Pública de Taubaté, que já conseguiram aprovação ambiental da Cetesb, que em novembro de 2023, autorizou a supressão de vegetação nativa para a instalação dos postes entre a Lagoinha e o Peres.

O sinal de internet é bom na praia do Peres. Os moradores usam energia solar ou geradores para carregarem seus aparelhos. Quem usa energia solar nos dias de chuvas fica sem poder usar equipamentos como geladeira e máquina de lavar porque não existe energia suficiente.

Prefeitura

O portal Notícias das Praias procurou no amo passado a prefeitura municipal de Ubatuba para saber como andava a reivindicação dos moradores da praia do Peres sobre a implantação de energia no local ou se existia algum estudo para prolongamento da rede de energia da Lagoinha até a praia. A prefeitura sugeriu apenas que o portal procurasse a Concessionária Elektro, responsável pela distribuição de energia em Ubatuba.

Elektro

O NP também procurou o gerente da concessionária Elektro em Ubatuba, Vinicius Ferraro. Ele adiantou, que desde de dezembro de 2023, o processo para prolongar a instalação de energia da Lagoinha até a praia do Peres estava parado devido a questões ambientais. Segundo ele, tudo indicava que para se instalar postes e a rede elétrica até o Peres haveria a necessidade de supressão de vegetação nativa e isso ainda estaria sendo regularizado.

A concessionária informou que solicitou autorização ao órgão ambiental para poder proceder às ligações pretendidas na Praia do Peres, em Ubatuba. O pedido estaria sendo analisado pela CETESB. Segundo a Elektro, após a obtenção da autorização, ainda há os prazos internos para a efetiva implantação da rede no local.

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