MPF denuncia prefeito de Guarujá (SP) por desvio de recursos públicos destinados à saúde

Denúncia é baseada em investigações da Polícia Federal e órgãos de controle, que apuraram diversas irregularidades em contrato com a OS Pró-Vida

O Ministério Público Federal (MPF) denunciou o prefeito de Guarujá (SP), Válter Suman (PSDB), e outras sete pessoas por crimes de peculato, advocacia administrativa (arts. 312 e 321 do Código Penal), fraude em licitação e prorrogação irregular da vigência de contrato (arts. 90 e 92 da Lei 8.666/1993). A denúncia é baseada em investigações da Polícia Federal e órgãos de controle, que apuraram diversas irregularidades em contrato firmado em 2020 entre a Prefeitura Municipal de Guarujá e a Organização Social (OS) Pró-Vida para a instalação de central de triagem e 14 leitos para o atendimento de pacientes com covid-19.

Investigações realizadas no âmbito da Operação Nácar-19, deflagrada em 2021, e apurações feitas pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE/SP), Controladoria-Geral da União (CGU), e Tribunal de Contas da União (TCU) indicaram a existência de um complexo esquema de corrupção na Prefeitura de Guarujá, onde grande parte dos contratos firmados para a área da saúde seriam previamente negociados e ajustados entre empresários e agentes públicos, mediante o pagamento de vantagens ilícitas. Essas vantagens indevidas seriam então aproveitadas pelo grupo criminoso, via lavagem de capitais, com o ocultamento e a utilização de terceiras pessoas (laranjas), dentre elas, pessoas contratadas pela própria prefeitura.

A denúncia em questão é referente a apenas um contrato firmado com a OS Pró-Vida, o Contrato de Gestão Emergencial 68/2020, em que foram encontradas diversas irregularidades, no entanto, o MPF já solicitou à Delegacia de Polícia Federal de Santos a instauração de quatro inquéritos policiais para investigar a prática de crimes em relação a outros três contratos firmados entre o município de Guarujá e a OS nos anos de 2018 a 2020.

A peça acusatória será agora apreciada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3). Se houver o recebimento da denúncia, os acusados passam à condição de réus, tendo garantidos o exercício do direito ao contraditório e à ampla defesa.

Os denunciados – Os envolvidos foram denunciados pela prática dos seguintes crimes:

– Válter Suman, prefeito de Guarujá
Artigo 90 da Lei 8.666/1993 c/c. o artigo 29 do Código Penal; artigo 312, § 1º, c/c. o artigo 13, § 2º, alínea “a”, e o artigo 29, todos do Código Penal (por 5 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 92 da Lei 8.666/1993 c/c. o artigo 29 do Código Penal, todos em concurso material (art. 69 do Código Penal).

– Vitor Hugo Straub Canasiro, secretário Municipal de Saúde
Artigo 90 da Lei 8.666/1993 c/c. o artigo 29 do Código Penal; artigo 312, § 1º, c/c. o artigo 13, § 2º, alínea “a”, e o artigo 29, todos do Código Penal (por 5 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 92 da Lei 8.666/1993 c/c. o artigo 29 do Código Penal, todos em concurso material (art. 69 do Código Penal).

– Jamile Cristina Favero Santos, servidora da Prefeitura de Guarujá
Artigo 90 da Lei 8.666/1993 c/c. o artigo 29 do Código Penal; artigo 321 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 6 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal, todos em concurso material (art. 69 do Código Penal).

– Almir Matias da Silva, administrador da OS Pró-Vida
Artigo 90 da Lei 8.666/1993 c/c. o artigo 29 do Código Penal; artigo 321 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 6 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 36 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 9 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 3 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 7 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 92 da Lei 8.666/1993 c/c. o artigo 29 do Código Penal, todos em concurso material (art. 69 do Código Penal).

– Cleide Rosa Florêncio Matias da Silva, administradora da OS Pró-Vida
Artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 36 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 9 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 3 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 7 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal, todos em concurso material (art. 69 do Código Penal).

– Vladermir Moreira Santos, dono de empresa envolvida no esquema e marido de Jamile Cristina Favero:
Artigo 90 da Lei 8.666/1993 c/c. o artigo 29 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal, todos em concurso material (art. 69 do Código Penal).

– Edson Araújo Alcarpe, dono de empresa envolvida no esquema:
Artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 7 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal.

– Guilherme Alves Rezende, dono de empresa envolvida no esquema:
Artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 9 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 c/c. o artigo 29, ambos do Código Penal (por 3 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal; artigo 312 do Código Penal (por 2 vezes), na forma do artigo 71 do Código Penal, todos em concurso material (art. 69 do Código Penal).

Além da responsabilização dos denunciados pelos crimes cometidos e da perda dos cargos públicos, em relação ao prefeito Válter Suman, ao secretário Vitor Hugo Straub Canasiro e à servidora Jamile Cristina Favero Santos, o MPF requereu a condenação dos denunciados à reparação dos danos causados ao erário, no valor mínimo de cerca de R$ 14 milhões.

Irregularidades – Entre as irregularidades do Contrato de Gestão Emergencial 68/2020, constam vícios na elaboração do termo de referência; ausência de justificativa plausível para escolha da OS Pró-Vida; realização de pagamentos por serviços não previstos; aditivos em desconformidade com a lei, entre outros.

Analisando as prestações de contas disponibilizadas pela Secretaria Municipal de Saúde de Guarujá foi verificado que a OS Pró-Vida contratou terceiros para a prestação de serviços médicos, higienização, limpeza, fornecimento de medicamentos, serviços de publicidade em que, em alguns casos, não foi comprovado que os serviços tinham sido executados ou fornecidos e faltavam informações sobre o processo de contratação.

Sobre a prestação de contas do contrato, 98,55% do total dos repasses efetuados pelo município de Guarujá à organização social foram consideradas despesas inconsistentes e/ou não comprovadas, ou seja, montante de cerca de R$ 12,2 milhões. Para os órgãos de controle, os gestores municipais não realizaram a fiscalização da execução do contrato de forma efetiva, e, por outro lado, contribuíram para que as irregularidades ocorressem, uma vez que deixaram de tomar as medidas legais cabíveis, como a suspensão de repasses à OS.

OS Pró-Vida – Em abril de 2020, a Organização Social Pró-Vida foi contratada para instalar central de triagem e 14 leitos no Pronto Socorro Prof. Dr. Matheus Santamaria, no valor aproximado de R$ 7,9 milhões, e prazo de vigência de 180 dias. Em outubro, foi assinado termo aditivo por mais 88 dias, ao custo de R$ 3,4 milhões. Em dezembro, mais um termo aditivo, por 90 dias, ao custo de R$ 3,9 milhões.

Em razão de representação sobre o atraso no pagamento dos salários dos funcionários, além da falta de médicos e materiais de trabalho nas unidades gerenciadas pela OS, foi instaurado inquérito no âmbito do Ministério Público do Estado de São Paulo, que recomendou a intervenção no referido contrato. Em março de 2021, foi determinado o afastamento da OS Pró-Vida do gerenciamento das unidades de saúde municipais e nomeado um conselho interventor, que assumiu os serviços prestados pela OS. Após isso, foi firmado o terceiro aditivo ao contrato no valor de R$ 6,6 milhões.

De acordo com relatório do TCU, a Pró-Vida foi criada em 2009 e, além da sede na cidade de Itupeva (SP), contava com duas filiais no município de Atibaia (SP), as quais apresentavam situação cadastral “inapta”. O TCU apurou elevado volume de ações judiciais movidas por empresas fornecedoras de serviços e por funcionários e colaboradores da OS, em razão do não recebimento dos valores que lhes eram devidos, o que atestou o alto risco de os recursos públicos recebidos no âmbito dos contratos de gestão firmados com a OS estarem sendo desviados para outras finalidades.

De outra parte, a CGU considerou que a referida contratação poderia ter sido evitada, o que impediria, desta forma, a reincidência das irregularidades que haviam sido constatadas na execução de contratos formalizados anteriormente com a OS Pró-Vida.

Processo 5029597-35.2022.4.03.0000.

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