No último dia 23, um homem invadiu aldeia e ameaçou indígenas; episódio soma-se a outros de violência, que em 2018, culminou no assassinato do indígena guarani João Mendonça Martins. Foto da aldeia/ Mônica Marins.
O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com ação civil pública para assegurar o direito à segurança da comunidade da Terra Indígena Tekoha Jevy, conhecida como Aldeia Rio Pequeno, em Paraty (RJ). A ação é para que o Estado do Rio de Janeiro e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) tomem providências para encerrar a escalada de violência na região.
Na última segunda-feira (23), um homem não identificado invadiu a comunidade e ameaçou seus integrantes, gritando: “vou matar índio, vou matar mesmo”. O caso foi registrado na 167ª DP. Esse episódio se soma a outros vários casos de violência pelo qual os povos da Aldeia Rio Pequeno vêm enfrentando nos últimos anos. Em janeiro de 2018, a região sofreu um crime de triplo homicídio, em que foi vitimado um indígena guarani João Mendonça Martins, com possível relação com o processo de demarcação de terras, segundo os integrantes da aldeia; também foi revelado haver ameaças aos índios locais.
Na ação, o MPF pede para que o Estado do Rio de Janeiro promova a capacitação e o treinamento de suas forças de segurança em Angra dos Reis e Paraty a fim de lidar com questões específicas relacionadas ao povo guarani, como tradições, costumes e direitos. Já a Funai deve, junto com a União e o estado, elaborar protocolos de cooperação e mecanismos de comunicação para estabelecer com clareza as respectivas responsabilidades e se coordenar a fim de evitar conflitos de atribuições em relação à segurança dos integrantes da Terra Indígena Tekoha Jevy.
A Funai deve ainda criar conselhos consultivos ou na formação de equipes de segurança comunitária que necessariamente deverão contar com a participação do povo guarani da aldeia do Rio Pequeno no processo de tomada de decisão.
A União e o Estado do Rio de Janeiro, por sua vez, devem criar mecanismo de monitoração e avaliação contínua da atuação das forças de segurança na Terra Indígena Tekoha Jevy de modo a identificar problemas e tomar medidas para corrigi-los, bem como criar núcleos especializados em assuntos indígenas na Delegacia de Polícia Federal em Angra dos Reis e no Batalhão da Polícia Militar de Angra dos Reis e na 2ª Companhia Independente de Polícia Militar de Paraty.
“É preciso fortalecer os mecanismos de proteção dos direitos dos membros da Terra Indígena Tekoha Jevy por meio de ações de fiscalização e punição das atividades ilícitas que ali ocorrem, de modo a evitar a causação de danos à comunidade”, alerta o procurador da República Aldo de Campos Costa, autor da ação.
Para o procurador, “a falta de coordenação entre as forças de segurança tem levado a Funai, a Polícia Federal e a Polícia Militar a ações descoordenadas e ineficientes na Terra Indígena Tekoha Jevy. E isso não só atrasa a resolução de problemas, mas causa, igualmente, confusão nas lideranças daquela comunidade indígena, que não sabem a quem recorrer”.
Demarcação – Em agosto de 2020, o MPF ingressou com ação civil pública (n. 5000655-81.2020.4.02.5111), com pedido de liminar, para que fosse declarada a mora do Estado brasileiro na demarcação da Terra Indígena Tekohá Jevy, em Paraty (RJ), para que, com isso, fosse determinada à Funai o imediato prosseguimento ao processo de demarcação (Processo n. 08620.047112/2014-42).
Os estudos da terra indígena, aprovados por meio do Despacho nº 2/PRES, de 20 de abril de 2017, Processo n. 08620.047112/2014-42, reconheceram a ocupação permanente da Terra Indígena Tekohá Jevy, dos povos indígenas Guarani Mbyá e Nandéva, com superfície aproximada de 2.370 hectares e perímetro aproximado de 27 quilômetros, localizada no Município de Paraty/RJ, (D.O.U., de 24 de abril de 2017 – Documento 4, Págs. 163-165). No entanto, não houve a emissão da Portaria Declaratória pelo Ministério da Justiça e consequente prosseguimento do procedimento.
A Terra Indígena Tekoha Jevy, onde vive uma população de 32 Guarani Ñandeva, também é conhecida como Terra Guarani do Rio Pequeno, localizada na cidade de Paraty, sul do estado do Rio de Janeiro. Ainda segundo o estudo de identificação, a terra é tradicionalmente ocupada por famílias Guarani Mbya e Guarani Ñandeva, dois grupos do povo guarani, por meio de alianças de casamento. Nos anos 1960, a área passou a ser alvo de invasões por não indígenas e violentos ataques, que levaram à expulsão das famílias Guarani Mbya que lá viviam e ao confinamento dos Guarani Ñandeva. Na língua guarani, tekoha jevy significa “a terra que está de volta”.