MPF aciona Prefeitura de Caraguatatuba e CEF por alagamento em loteamento

O Ministério Público Federal entrou com ação contra a Caixa Econômica Federal e o Município de Caraguatatuba (SP) para que novas residências sejam fornecidas a moradores do loteamento Bosque dos Guarandis, no bairro Travessão, vítimas de frequentes inundações pela água das chuvas. Em 2011, as unidades habitacionais, financiadas pelo Programa Minha Casa Minha Vida, foram erroneamente construídas em terreno alagadiço, inapto a receber moradias. Desde então, seus ocupantes sofrem com alagamentos e condições insalubres, incontáveis prejuízos materiais e riscos à sua integridade física.

 

O MPF quer que os imóveis sejam substituídos por outros de mesmo padrão com condições de habitabilidade, no prazo máximo de três meses, ou então que os valores já pagos pelos consumidores sejam reembolsados. A ação também pede que os réus arquem com indenizações pelos danos patrimoniais e morais causados aos moradores. Além da Caixa e da municipalidade, respondem ao processo a construtora R.J. Bonato Engenharia e Construção Ltda., responsável pela obra, e seus cinco sócios.

 

As unidades habitacionais afetadas estão localizadas nas ruas Roberto Ramos das Mercês e Henrique Maximiliano Coelho Neto, na quadra 16 do loteamento, próximas a uma Área de Preservação Permanente. Devido às condições do terreno, as ruas ficam inteiramente alagadas em períodos de chuvas intensas e a água invade o interior das residências, algumas vezes ultrapassando a altura da cintura dos moradores. A frequência das inundações é tão grande que alguns proprietários construíram estruturas para suspender móveis, eletrodomésticos e animais, única forma de tentar minimizar os prejuízos sofridos.

 

Móveis e até os animais tiveram que ser suspensos para fugir das enchentes

 

 

Às perdas materiais se somam os danos de ordem moral e a submissão a condições insalubres e perigosas. Perícia realizada por técnicos do MPF constatou que, como consequência dos alagamentos, diversas casas apresentam manchas pretas de umidade e bolor, paredes com trincas, pintura estufada e portas de madeira deterioradas, além do retorno de esgoto e dejetos pelos ralos. “Os moradores convivem com o sofrimento de suportar o desconforto e a insalubridade inerentes às inundações periódicas, bem como com o risco de curto-circuito e incêndio, sem disporem de recursos para se mudarem, justamente quando lhes parecia realizado o sonho da casa própria”, ressalta a procuradora da República Walquiria Imamura Picoli, autora da ação.

 

Vícios conhecidos – Os problemas enfrentados na quadra 16 do loteamento Bosque dos Guarandis já eram de conhecimento do município de Caraguatatuba muito antes da construção das unidades. Em 1994, quando os lotes foram adquiridos, a municipalidade já previa a implantação de um sistema de drenagem para o escoamento de águas devido às graves inundações na região. Dois anos depois, contudo, o loteamento foi aprovado pela municipalidade sem a implantação da infraestrutura mínima necessária e sem a aprovação de órgãos públicos, como a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) e o Graprohab (Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais do Estado de São Paulo).

 

Apesar de diversas advertências técnicas quanto à falta de rede de águas pluviais no loteamento, em 2010, o Município de Caraguatatuba aprovou a construção de 100 unidades habitacionais. Destas, 54 foram financiadas pela Caixa por meio do Programa Minha Casa Minha Vida, localizadas justamente nos terrenos onde a municipalidade deveria ter implantado um sistema de escoamento e drenagem de águas para atenuar os já conhecidos problemas de inundação na região.

 

Não faltam indícios de que a implantação do loteamento e a liberação das obras ocorreram sem a devida fiscalização da administração municipal. Isso porque os lotes da quadra 16 avançaram sobre a Área de Preservação Permanente, a demonstrar que algumas casas não deveriam estar onde foram erguidas. Além disso, a municipalidade aprovou a construção dos imóveis no mesmo nível da rua, sem o aterramento exigido pela legislação municipal, agravando ainda mais a situação dos alagamentos dentro das residências.

 

Da mesma forma, a análise da Caixa em relação ao projeto também se mostrou deficiente. Ao emitir parecer favorável ao financiamento das unidades habitacionais, o banco permitiu que os moradores ocupassem área de risco e se expusessem constantemente a situações de perigo. Soma-se a isso o fato de a instituição financeira ter agido nos últimos anos de forma negligente, sem adotar nenhuma providência para remediar a situação. Nas tentativas do MPF de resolver amigavelmente o caso, a Caixa negou os problemas técnicos e reduziu a questão a mera ausência de aterros e de alguns muros pelo fato de a empreiteira ter abandonado o projeto com 93,51% dos trabalhos concluídos. Ainda assim, em vez de acionar a seguradora e substituir a construtora, conforme previsto em contrato, o banco seguiu buscando transferir aos consumidores a responsabilidade pela conclusão das obras.

 

Problemas insanáveis – No entanto, ao contrário do que sugere a Caixa, os vícios de construção identificados no loteamento Bosque dos Guarandis não são problemas de natureza estrutural, arquitetônica ou estética, solucionáveis com medidas de reforma ou reparo. Em sua ação, o MPF destaca que, segundo a perícia técnica, os imóveis foram construídos erroneamente naquela região, de forma que eventuais intervenções para implantação de rede de drenagem pluvial no interior do empreendimento mostram-se potencialmente ineficazes.

 

Por isso, a necessidade de substituição dos imóveis ou de ressarcimento dos consumidores. “É evidente que o caso dos autos decorre de erro, plenamente evitável, de se projetar a construção de casas em áreas sabidamente alagadiças, insalubres, de risco. Trata-se de imóveis com vícios essenciais e insanáveis. Isso porque aprovados, financiados e construídos em local inapto a receber moradias, sendo totalmente previsível a ocorrência de inundações recorrentes”, conclui a procuradora.

 

Prefeitura

A Secretaria de Assuntos Jurídicos informa que a Prefeitura de Caraguatatuba figura como polo passivo de forma subsidiária na ação proposta contra a Caixa Econômica Federal e a construtora responsável pela obra. Dessa forma, a Prefeitura aguarda a citação para se manifestar oficialmente nos autos.

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