Eletronuclear diz não ter dinheiro para pagar Angra

Presidente da estatal diz não ter dinheiro para honrar a contrapartida em compensações socioambientais pela construção de Angra 3

 

O diretor-presidente da Eletronuclear, Eduardo Grivot, admitiu em audiência pública na Comissão de Minas e Energia da Câmara dos Deputados, em Brasília, que a estatal não tem dinheiro para pagar os R$ 264 milhões que deve à Prefeitura de Angra dos Reis a título de compensações ambientais pela construção da usina nuclear Angra 3.

Grivot argumentou que, com a interrupção das obras de Angra 3, durante a Lava Jato, não há recursos orçamentários para quitar a dívida. “Eu assino o compromisso de R$ 264 milhões, que é apresentado pela prefeitura, mas eu não vou ter dinheiro para pagar tudo. Há um problema de orçamento, que é público. Mas não tenho R$ 264 milhões”, disse.

Fernando Jordão, prefeito de Angra dos Reis, reagiu. “Não querem pagar. Tem que trabalhar para arranjar dinheiro. Se tem dinheiro para obra, por que não tem dinheiro para o município?”, enfatizou durante a sessão, que discutiu o vazamento de material radioativo da usina, em setembro de 2022. O governo federal já anunciou a pretensão de construir a quarta usina nuclear na cidade.

Durante a audiência pública, Jordão também rechaçou o argumento usado pela Eletronuclear que, em sessão na Câmara de Vereadores de Angra dos Reis, no dia 12 de abril, alegou falta de projetos para não fazer o repasse de recursos. “[Então] não adianta vir [dizer] que não tem projeto porque é mentira. Vocês estão contingenciando [o pagamento da dívida por] falta de dinheiro. Vocês precisam ter uma equação financeira para priorizar a cidade de Angra, de Paraty e Rio Claro. Não os prefeitos, mas a nossa população“.

De acordo com a deputada estadual Célia Jordão (PL-RJ), presente à sessão da Comissão de Minas e Energia, argumentou que, “por mais que a Eletronuclear tenha passado por momentos difíceis com a Lava Jato, o povo não pode sofrer as consequências. É preciso estabelecer um cronograma orçamentário”, defendeu.

DÍVIDA ANTIGA

A dívida da Eletronuclear com a prefeitura de Angra dos Reis é antiga. Em outubro de 2009, a estatal e a Prefeitura assinaram um termo de compromisso para o repasse de recursos a serem usados em projetos socioambientais na cidade. Foi a contrapartida à cessão do terreno pela prefeitura para a construção de Angra 3. Em valores atualizados, essa contrapartida em compensações socioambientais atinge R$ 264 milhões.

“Estamos em 2023 e ainda debatendo regras que foram estabelecidas lá atrás. A União e a Eletronuclear precisam ter responsabilidade com os municípios e construir um cronograma orçamentário para honrar seus compromissos”, disse a deputada estadual Célia Jordão (PL-RJ).

Na audiência pública, o prefeito Fernando Jordão ressaltou que defende a matriz energética nuclear brasileira. Mas argumentou que, enquanto a Eletronuclear não pagar o que deve ao município, as obras de Angra 3 permanecerão paralisadas. A Prefeitura embargou a obra no último dia 19 de abril, após mudanças no projeto urbanístico inicialmente aprovado pela gestão municipal.

A audiência pública na Comissão de Minas e Energia foi pedida pelo deputado federal Max Lemos (PDT-RJ) após a Eletronuclear, que administra o complexo nuclear de Angra, omitir das autoridades o vazamento de material radioativo ocorrido na usina Angra 1 em setembro do ano passado, fato que posteriormente foi confirmado pela própria estatal.

A pedido do Ministério Público Federal, a Justiça Federal determinou que a Eletronuclear realize uma avaliação completa dos danos causados. Além disso, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) multou a empresa.

Sobre o caso, Fernando Jordão cobrou o diretor-presidente da Eletronuclear para que a estatal cumpra com as normas internacionais de comunicação de acidentes com material radioativo, independentemente da quantidade ou do potencial de danos às pessoas ou ao meio ambiente. “Não são vocês [Eletronuclear] que vão decidir que a partir de agora vão comunicar. São normas internacionais. [Vocês] sabem disso, [mas] omitiram a comunicação do evento. Isso foi muito grave“, enfatizou Jordão.

A sessão teve, ainda, a presença da deputada estadual Célia Jordão (PL-RJ); do prefeito de Paraty, Luciano Vidigal; de representantes do Ministério de Minas e Energia; de vereadores de Angra e secretários da Prefeitura de Angra.

Eletronuclear esclarece dúvidas sobre convênios com prefeituras de Angra dos Reis e Paraty

A Eletronuclear esclarece que os compromissos socioambientais pela construção da usina nuclear Angra 3 são norteados por condicionantes estabelecidas pelo Ibama. A partir disso, foi firmado um Termo de Compromisso entre a empresa e as prefeituras a fim de destinar verbas para convênios que visem a execução de programas e projetos que atendam à população nas áreas de educação, saúde, saneamento ambiental, segurança pública, desenvolvimento local, ou aqueles que tenham relação com os impactos do empreendimento para a localidade. Assim, não há liberação de valores diretamente para os municípios sem estar atrelada à execução de um convênio. Vale ressaltar ainda que o repasse dos valores é apenas uma parte do processo, visto que a condicionante somente é considerada atendida pelo órgão licenciador após a realização do projeto, objetivo principal da Eletronuclear.

Ou seja, a Eletronuclear deve implementar medidas mitigadoras visando atenuar possíveis impactos socioambientais gerados aos municípios ou ainda para adequar a infraestrutura das cidades à nova realidade que virá com o empreendimento em função da implantação e operação dele. Isso significa que não é todo projeto ou programa que poderá receber os investimentos da empresa, pois a mesma precisa cumprir as condicionantes estabelecidas pelo Ibama.

Uma vez que o projeto ou programa é apresentado pela prefeitura, ele precisa atender a uma condicionante e seguir as regras para a celebração e execução dos convênios, a partir da legislação vigente. O município precisa, por exemplo, apresentar à Eletronuclear um projeto que contenha de forma detalhada um plano de trabalho com cronograma, metas das atividades e planejamento para a liberação das parcelas dos recursos pela empresa. Entretanto, para que os valores sejam pagos, os municípios precisam apresentar o contrato de execução dos serviços ou da compra de bens, realizada através de processo licitatório público. Cada convênio exige a abertura de uma conta bancária específica, que permita acompanhar a correta utilização dos recursos. As demais parcelas só serão pagas mediante a comprovação da execução das etapas do projeto e da comprovação da regularidade na prestação de contas.

Destaca-se ainda que a liberação de recursos pela Eletronuclear para aplicação em cada projeto fica condicionada à liquidação prévia de quaisquer prestações de contas pendentes por parte do município com a empresa.

Do mesmo modo, vale ressaltar que as condicionantes das Licenças Prévia e de Instalação para a Usina Angra 3 precisam ser cumpridas até o momento de solicitarmos ao Ibama a licença para essa usina entrar em operação. Isso significa que os valores não precisam ser liquidados de uma só vez.

A companhia acrescenta que conta com cerca de R$500 milhões previstos no orçamento para atender os convênios socioambientais com as prefeituras citadas até a conclusão de Angra 3, sendo R$ 35 milhões apenas para 2023, porém até o momento a empresa não recebeu projetos suficientes para atingir este montante. De todo modo, o valor total previsto no Termo de Compromisso com as cidades não pode ser quitado integralmente em uma única parcela, nem utilizado como garantia de empréstimo bancário. Isso porque a liberação da verba para o atendimento das condicionantes precisa estar alinhada ao cronograma físico-financeiro do empreendimento. Essa questão foi abordada pelo presidente da Eletronuclear, Eduardo Grand Court, durante a audiência pública realizada nesta terça-feira (16), na Câmara dos Deputados, em Brasília.

A empresa reitera ainda que as condicionantes estabelecidas pelo Ibama precisam ser cumpridas até a usina entrar em operação, e não de uma só vez. Assim, a previsão de recursos orçamentários e financeiros acompanham o andamento da obra. De forma a acelerar a construção de Angra 3, a Eletronuclear está colocando em prática o Plano de Aceleração da Linha Crítica. Para tanto, contratou um consórcio formado por três empreiteiras para adiantar parte da obra civil e da montagem eletromecânica, enquanto a companhia viabiliza a contratação da empresa ou consórcio que concluirá o empreendimento.

Atualmente, as obras estão paralisadas, após a emissão de um auto de embargo pela prefeitura de Angra dos Reis. Entretanto, a empresa está empenhada em reverter a situação, buscando um diálogo construtivo com o município para esclarecer as questões apresentadas e encontrar uma solução que permita a retomada das atividades no canteiro.

Por fim, a Eletronuclear reitera que todos os convênios da empresa podem ser acompanhados por meio do link
https://www.eletronuclear.gov.br/Acesso-a-Informacao/Paginas/Convenios.aspx.

 

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