Imobiliária entrou com ação para que caiçaras desocupassem a ilha que é a maior de Caraguatatuba; juiz após conceder liminar, suspendeu em parte a sua decisão, mantendo os caiçaras na ilha
Por Salim Burihan
O juiz Ayrton Vidolin Marques Junior, da 1ª Vara de Caraguatatuba, no Litoral Norte Paulista, revogou nesta quarta-feira, dia 20, parte de uma liminar concedida no último dia 15 de março, à Belomar Incorporadora e Imobiliária, que retirava famílias caiçaras que vivem desde a década de 60 na Ilha do Tamanduá, a maior ilha de Caraguatatuba. Em sua decisão desta quarta-feira, dia 20, o juiz manteve as famílias na ilha.
A Ilha do Tamanduá tem 111 hectares e é a maior ilha de Caraguatatuba. Fica a cerca de 1 quilômetro da praia da Tabatinga, na região norte da cidade. Um total de 80% de sua costa é formada por rocha e possui apenas duas praias, as praias do Norte e a do Sul. Sua superfície é composta por 90% de vegetação preservada e 10% de rocha. A ilha já esteve a venda em 2017 por R$ 20 milhões, mas não teria sido comercializada, tudo indica, devido a presença dos caiçaras.
A concessão da Ilha do Tamamduá pertencia desde 1985 a família de João Roman Junior e posteriormente foi repassada à Belomar Incorporadora e Imobiliária. No dia 12 de março deste ano, a Belomar entrou com uma ação na justiça para que as famílias caiçaras desocupassem os imóveis e a ilha. No dia 15 de março, a justiça concedeu liminar a favor da empresa e obrigando os caiçaras a deixarem a ilha.
Quando os oficiais de justiça estiveram na ilha, o caiçara Luiz de Oliveira, de 56 anos, pescador e nativo da Ilha do Tamanduá, decidiu procurar o advogado Felipe Alves para tentar manter a sua família na ilha. A família vive na Praia do Sul e vive da pesca. Os pais de Luiz, seu Francisco Jorge de Oliveira e dona Alzira Costa, construíram a primeira casa na ilha na década de 60, justamente, na praia do Sul, onde viviam da pesca.
Seu Francisco construiu uma casa de pau a pique, com requintes de modernidade, pois usou materiais que conseguiu no continente como cimento e madeiras. Nas proximidades da casa foram plantadas árvores frutíferas, cana-de-açúcar e uma pequena horta. Com o passar dos anos e a família aumentando, uma segunda casa foi construída. Do casal Oliveira 12 filhos foram gerados.
Considerando as dificuldades de locomoção diária para o continente, para que as crianças frequentassem a escola e os adultos buscassem abastecimento, transporte de pescador, a manutenção da saúde etc, parte da família mudou-se para o continente acomodando-se numa moradia na praia da Tabatinga.
Luiz de Oliveira através de seu advogado Felipe Rodrigues Alves, no dia 18 de março, entrou com um pedido para que o juiz Ayrton Viladoin suspendesse a liminar concedida à Belomar e mantivesse sua família na ilha. O advogado Felipe Rodrigues Alves alertou o juiz que os caiçaras, assim como indígenas e quilombolas, são reconhecidos pelo decreto 6040, de 2007, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como povos de comunidades tradicionais. Alves anexou depoimentos e testemunhos importantes que confirmam a presença dos caiçaras na ilha desde a década de 60. O advogado também contratou laudo de profissionais para comprovar que os imóveis ocupados pelos caiçaras existem há muitos anos na ilha.
“Comuniquei ao juiz que os caiçaras, assim como quilombolas e indígenas, são considerados povos de comunidades tradicionais, protegidos pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais. Os caiçaras, assim como os quilombolas e indígenas, possuem formas próprias de organização social, ocupam e usam seus territórios e recursos naturais como condição para a sua reprodução cultural, social, religiosa e econômica. Esses espaços podem ser usados de maneira permanente ou temporária”, destacou em sua defesa, o advogado Felipe Alves.
A decisão cabe recursos(agravos) no Tribunal de Justiça. Não conseguimos contato com a Belomar Incorporadora e Imobiliária para que ela se manifestasse sobre a decisão da justiça proferida nesta quarta-feira, dia 20. Estamos tentando saber se a empresa pretende recorrer da decisão. Assim que conseguirmos uma manifestação da Belomar iremos anexar ao texto original desta reportagem.