Caiçaras fazem petição para manter reserva em Ilhabela; Colucci alega que resex de Castelhanos será discutida no Plano Diretor

Prefeito confirmou que família tem propriedade em Castelhanos, mas negou que pretende construir um “resort” no local 

 

O Coletivo Caiçara iniciou uma petição na internet que cobra a anulação da votação pela Câmara de Vereadores de Ilhabela que extinguiu a RESEX CASTELHANOS e o imediato restabelecimento da unidade de conservação.

Na petição, o Coletivo Caiçara alega que não é de hoje que o Prefeito de Ilhabela Antonio Colucci ataca o modo de vida das comunidades tradicionais de Ilhabela.

Segundo o coletivo, desta vez, o prefeito extinguiu, literalmente do dia para a noite e sem nenhum diálogo com a comunidade ou com a sociedade civil a RESEX CASTELHANOS, que protege parte do território tradicional caiçara, cuja riqueza ambiental, arqueológica e cultural foi reconhecida por inúmeros documentos técnicos e pelo próprio município.

A RESEX castelhanos foi criada por meio do processo administrativo nº 5512-5/2020E, após anos de diálogo com a comunidade sobre a regularização fundiária de seu território.

O coletivo destaca que em consulta pública, a sociedade se manifestou fortemente pela criação da unidade de conservação, dada a relevância cultural, ambiental e arqueológica do local, conforme inúmeros documentos técnicos que fundamentaram sua criação e demonstraram a importância de preservar o local, fundamental para a reprodução física e cultural da comunidade caiçara que vive nele há séculos.

Segundo o coletivo, a Resex Castelhanos é fruto de anos de luta e dedicação de um povo que quer apenas permanecer em paz em seu território. Entretanto, para o espanto de todos, sem nenhum diálogo com a comunidade tradicional ou com a sociedade civil, e sem manifestação do Conselho do Meio Ambiente e do Conselho das Comunidades Caiçaras, o Exmo. Prefeito Municipal de Ilhabela, na CALADA DA NOITE, encaminhou em regime de urgência para a Câmara de Vereadores projeto de lei que, na mesma noite, foi votado sem qualquer discussão e extinguiu a RESEX Castelhanos, em total afronta ao que determina a Constituição Federal e à legislação.

Na petição, o coletivo caiçara alega que a comunidade está em estado de alerta e não permitirá que esse retrocesso na defesa de seu território tradicional se concretize. “Nós, da sociedade civil, manifestamos apoio à defesa do território tradicional caiçara da Castelhanos e aos recursos ambientais e arqueológicos que existem no local. Pela anulação da ilegal votação que extinguiu a RESEX CASTELHANOS e imediato restabelecimento da unidade de conservação”, finaliza o texto da petição iniciada na internet que até ontem somava mais de 1.600 assinaturas.

 

Colucci

 

 

Em entrevista concedida na manhã de quarta-feira(24), ao Jornal da Morada, emissora FM de São Sebastião, o prefeito Toninho Colucci foi abordado sobre a questão pelos jornalistas  Júlio Buzi e Gustave Gama.

 

Colucci alegou que o decreto da ex-prefeita Gracinha criando a resex de Castelhanos  foi feito no “apagar das luzes de sua gestão”, ou seja, assinado no dia 29 de dezembro de 2020, há dois dias do término do mandato da prefeita. Segundo ele, o decreto teria sido assinado sem que a sociedade de Ilhabela fosse consultada.

 

Para Colucci, a Baía de Castelhanos é importante para Ilhabela e deve ser amplamente discutida durante a atualização do Plano Diretor da Ilha que, segundo ele, não é atualizado há 15 anos. O prefeito disse que está contratando uma equipe para atualizar o Plano Diretor e colocá-lo em discussão na Câmara.

 

Com relação a Castelhanos, o prefeito entende que é importante a preservação ambiental, a comunidade tradicional, a pesca artesanal, o turismo…, mas que a discussão tem que ser ampla e debatida por toda a comunidade ilhabelense e, não apenas, atendendo o desejo de alguns moradores de Castelhanos e de representantes do ministério público federal.

 

Segundo ele, existem ações na justiça questionando a implantação da resex, por proprietários de imóveis no local e, até, mesmo, pelo SPU(Secretaria de Patrimônio da União).

 

Colucci disse que sua família é proprietária de uma grande área em Castelhanos, mas que sua decisão( de suspender a resex) não teria  nenhuma ligação com isso e que nunca teve interesse em implantar um resort no local, como, segundo ele,  “comentam na cidade”.

 

Entenda

 

Para ambientalistas, a decisão de Colucci pode colocar em risco as comunidades tradicionais caiçaras de Ilhabela (SP) e confirma a pressão que vem ocorrendo na região em cima de prefeitos e vereadores por parte de empresários ligados ao setor imobiliário no sentido de ocupar áreas que sempre foram preservadas devido a sua importância ambiental e social. A suposta “atualização” de planos diretores nas cidades da região visa liberar a construção nessas áreas, como é o caso da baía de Castelhanos.

O decreto  que criou a Resex foi assinado em dezembro de 2020 pela então prefeita Gracinha. A Reserva Extrativista (ResexBaía de Castelhanos, tinha com área total aproximada de 957 km² e um trecho de costa com cerca de 25 km de extensão, com início na Ponta da Pirassununga e término na Ponta da Cabeçuda.

O Ministério Público Federal (MPF) participou ativamente do processo que levou à criação da Resex desde 2014, quando foram realizadas as primeiras reuniões sobre a regularização fundiária do território das comunidades caiçaras, direito assegurado pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

“Mais do que uma simples delimitação de terreno, a Resex vai garantir que os caiçaras possam manter seu modo de vida tradicional, retirando seu sustento da terra e do mar de forma sustentável, com seu respeito natural ao meio ambiente”, afirmou a procuradora da República Maria Rezende Capucci, quando da publicação do decreto pela prefeitura de Ilhabela, em dezembro de 2020.

Além de solucionar a questão fundiária das comunidades caiçaras que vivem na área, a Resex também tinha o papel importante na preservação ambiental, já que abrange o maior remanescente de restinga de Ilhabela e uma extensa área de manguezais. A região contempla três dos cinco ecossistemas reconhecidos como patrimônio nacional pela Constituição – Serra do Mar, Zona Costeira e Mata Atlântica –, além de ser considerada Reserva da Biosfera pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, o que a transforma em um patrimônio natural de importância internacional.

Para implantar a Resex de Castelhanos, seria criado um conselho gestor provisório, formado pelo secretário de Meio Ambiente de Ilhabela e pelos presidentes das associações Castelhanos Vive e Amor Castelhanos. Segundo o decreto, três ações eram prioritárias: cadastramento da população extrativista que vive na Resex; elaboração de plano de manejo da reserva; e assinatura de contrato de concessão real de uso dos recursos naturais pelos caiçaras.

Além da questão das atividades de sobrevivência, a Resex é importante para proteger as CTs, que sofrem, ao longo dos anos, com a especulação imobiliária. A implantação da reserva também garantia as comunidades o poder de decisão sobre várias questões relativas ao uso da terra, sempre respeitando os aspectos legais e ambientais.

 

A Câmara de Ilhabela realizou, no dia 16, duas Sessões, uma Ordinária e outra Extraordinária, tendo seus trabalhos presididos pelo vereador Alexander Augusto (Leleco Augusto) devido a ausência, por atestado médico, da presidente da Casa, vereadora Diana Matarazzo. Na ocasião foram aprovados cinco Projetos de Lei, um deles,  o PL 42/2022, do Executivo Municipal, que revogou o Decreto Municipal 8.351 de 2020 que dispõe sobre a criação da Reserva Extrativista da Baía de Castelhanos.

Em sua justificativa, o prefeito Toninho Colucci esclareceu que a matéria está sob júdice sendo discutida em Ação Popular, ajuizada por proprietários de imóveis matriculados com residências regularmente edificadas, há vários anos, na Comunidade Tradicional da Baía de Castelhanos.

Colucci também justificou que até o momento não houve articulação da Comunidade para a criação do Conselho Gestor, que deveria ser feito pelos presidentes das Associações, assim como, não há previsão orçamentária e nem definição ou deliberação de qual ente públicos arcará com o ônus de eventual desapropriação das áreas particulares matriculadas, para a efetiva implantação da unidade de conservação na Baía de Castelhanos.

Ainda de acordo com a Prefeitura, não ficou definido a qual entidade pública compete atribuição da gerência do Ressex, havendo desentendimentos entre os moradores do local que possuem matrículas de suas áreas. Segundo a prefeitura, os aludidos proprietários tiveram acesso negado a sua propriedade para realização necessária de reparos em seus imóveis, sendo que outros moradores, em situação equivalente, não foram impedidos de levarem material ao local. De modo que a propositura foi apresentada para que não ocorra injustiça entre as partes e para que se realize um amplo debate público sobre a preservação da comunidade.

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