Segundo menor vertebrado do planeta, um sapinho de 7 milímetros, foi descoberto em Ubatuba

Nome científico concedido ao “sapinho” encontrado em Ubatuba-  batizada de B. dacnis, homenageia o Projeto Dacnis que há 15 anos trabalha com pesquisa e educação da biodiversidade da Mata Atlântica em Ubatuba e, também, nas cidades de São Francisco Xavier e Miracatu 

 

Estudo do Instituto de Biologia da Unicamp, em Campinas, publicado na última sexta-feira, dia 25, pelo Jornal da Unicamp, de autoria de Paula Penedo Pontes, descreveu uma nova espécie de sapo que habita matas fechadas úmidas e folhadas em Ubatuba, no Litoral Norte Paulista.

Descoberto na reserva ambiental do Projeto Dacnis, no bairro do Rio Escuro, região sul de Ubatuba, no Estado de São Paulo, o anfíbio do gênero Brachycephalus possui apenas 7 milímetros, tornando-se a segunda menor espécie de vertebrado do planeta. As imagens publicadas são de autoria de Paulo Cavalheri e do arquivo dos pesquisadores.

O artigo detalhando as características do animal, foi publicado no periódico científico PeerJ, contou com a colaboração de cientistas do Laboratório de História Natural de Anfíbios Brasileiros (Lahnab) e do Laboratório de Genômica Evolutiva do IB, além de pesquisadores do Museu de História Natural da Flórida (Estados Unidos), da Universidade de Nova York em Abu Dhabi (Emirados Árabes Unidos), do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de São Vicente e do próprio Projeto Dacnis.

O Notícias das Praias entrou em contato com a Unicamp para aprofundar o assunto e descobriu que foram os pesquisadores do Projeto Dacnis, em Ubatuba, Edélcio Muscat, Ivan Nunes e Lucas Machado Botelho, os responsáveis pela descoberta do novo “sapinho”.  Entramos em contato com o biólogo, pesquisador e coordenador do Projeto Dacnis, Edélcio Muscat , para obter maiores informações sobre a descoberta inédita feita por eles em Ubatuba. Mantemos nesta edição do NP, as informações publicadas por Paula Penedo Pontes na edição de sexta-feira, dia 25, do Jornal da Unicamp.

Ubatuba

A descoberta do novo sapinho ocorreu há oito anos por pesquisadores do Projeto Dacnis, em Ubatuba. “A gente descobriu há oito anos, mas acreditava ser uma espécie já conhecida. Há três anos, constatamos que o canto era diferente da espécie que já existia e decidimos aprofundar a pesquisa através de novas análises e exame de genética. Acionamos vários pesquisadores e foi constatado que a espécie que identificamos em Ubatuba, na verdade,  era nova, inédita”, explicou Edélcio Muscat, biólogo, pesquisador e coordenador do Projeto Dacnis, em Ubatuba. Um áudio gravado em campo, analisado pelo professor Luís Felipe Toledo, da Unicamp, coordenador do Lahnab e líder da pesquisa, constatou que se tratava, na realidade, de duas espécies distintas.

O Projeto Dacnis, uma organização não governamental, realiza há 15 anos pesquisas e projetos de educação sobre a biodiversidade da Mata Atlântica. A sede fica na entrada do bairro Rio Escuro, na região sul de Ubatuba. A identificação da nova espécie foi feita por Edélcio, Lucas Machado Botelho, ambos do Projeto Dacnis, Ivan Nunes(Fapesp), Andres Santiago Carrasco Medina e o professor Luiz Felipe Toledo, ambos da Unicamp.

Segundo Edélcio,  os exames e análises para a confirmação de que se tratava de uma nova espécie de animal, foram encaminhadas aos EUA e reconhecidas por pesquisadores norte-americanos do Museu de História Natural da Flórida. Edélcio destacou outros pesquisadores do Dacnis, da Unesp, da Unicamp e de outras instituições  nacionais e internacionais que foram chamados para contribuir na escrita do artigo científico.  A pesquisa teve o apoio  da  Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

 

A descoberta do novo sapinho ocorreu quando os especialistas da reserva do projeto perceberam dois sons diferentes enquanto gravavam o canto da espécie Brachycephalus hermogenesi
A descoberta do novo sapinho ocorreu quando os especialistas da reserva do projeto perceberam dois sons diferentes enquanto gravavam o canto da espécie Brachycephalus hermogenesi

 

Encontrar o animal, no entanto, revelou-se uma tarefa muito mais difícil. Além de possuir um tamanho diminuto, esse gênero canta no chão da floresta, escondido embaixo das folhas, e geralmente para de emitir sons quando alguém se aproxima. Ao capturarem o bicho, os pesquisadores constataram que as medidas e a forma do corpo eram idênticas às da espécie B. hermogenesi, não sendo possível distingui-las por suas características físicas.

“A gente chama isso de espécies crípticas, quando há espécies morfologicamente iguais. O canto ajuda muito a distinguir, mas nem sempre conseguimos fazer a gravação e às vezes pode se tratar de uma fêmea, que não canta”, afirmou Toledo.

Para descrever a nova espécie, a equipe realizou estudos sobre as características morfológicas, anatômicas, bioacústicas e moleculares do animal. Uma das principais inovações deu-se com o uso de ferramentas de ponta como técnicas de tomografia computadorizada de alta resolução que permitiram “dar um zoom” no corpo do sapo e visualizar detalhadamente até mesmo os pequenos seres ingeridos pelo anfíbio.

Ainda de acordo com o docente, o aspecto mais relevante da pesquisa não se apresentou ao descrever um dos menores sapos do mundo, mas ao demonstrar os extremos da biologia e trazer insights importantes para os demais cientistas. Exemplos disso incluem entender qual o menor tamanho que um coração pode ter ou como um bicho respira sendo tão pequeno. “Esses são questionamentos fisiológicos e evolutivos que a gente pode fazer depois da descrição das espécies, da mesma forma que o pessoal especializado em animais de grande porte faz. Como o coração manda sangue para o cérebro da girafa? Esses são limites dimensionais que a gente está conhecendo e que mostram o tamanho da vida na Terra”, explicou.

 

Descoberto na reserva ambiental do Projeto Dacnis, em Ubatuba (SP), o anfíbio é do gênero Brachycephalus
Descoberto na reserva ambiental do Projeto Dacnis, em Ubatuba (SP), o anfíbio é do gênero Brachycephalus
 

Principais características

A espécie descoberta, batizada de B. dacnis, possui diversas características de miniaturização, significando que o animal possui importantes diferenças morfológicas em relação aos sapos maiores. Um exemplo disso: a fusão e a perda óssea, que resulta na redução do número de dedos do bicho. Enquanto um sapo grande tem quatro dedos nas mãos e cinco dedos nos pés, o B. dacnis possui um dedo funcional a menos em cada membro. Tal característica demonstra que, por possuir um tamanho tão diminuto, não há espaço no corpo do animal para abrigar tantos elementos anatômicos.

Por outro lado, os cientistas ficaram surpresos ao descobrir que o sapinho também apresentou características de esqueleto típicas de sapos maiores, como partes do ouvido que lhes permitem escutar o próprio canto. Para se ter uma ideia, a espécie pingo-de-ouro, que também pertence ao gênero Brachycephalus, é relativamente maior do que o B. dacnis – alcançando 2 centímetros – e não possui essa característica. Uma hipótese ainda não testada por Toledo é a de que esses grupos que contam com menos elementos anatômicos possuem mais derivações evolutivas. Ou seja, eles primeiro passaram por uma redução no seu tamanho e depois sofreram a perda de elementos, mostrando que o B. dacnis, em comparação com o pingo-de-outro, estaria mais próximo do ancestral comum deles .

Os pesquisadores descobriram também que os membros dessa espécie colocam apenas dois ovos por vez, uma quantidade pequena para os anfíbios O sapo cururu, por exemplo, consegue colocar até 50 mil ovos de uma única vez. Além disso, dos ovos do B. dacnis saem sapos já formados – que não passaram pela fase dos girinos –, o que poderia ter facilitado a evolução desses anfíbios rumo a um tamanho menor, por se tratar de um sistema mais simples.

“Mas eles são bem abundantes na natureza. Você escuta centenas deles cantando de uma só vez. Mesmo com poucos ovos, eles devem colocar várias vezes por ano, porque se reproduzem sempre que está chovendo e chove muito na região de Ubatuba”, comentou o professor.

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