Bombeiros que ficaram “ilhados” por 48 horas durante a tragédia são homenageados em São Sebastião

Considerados heróis anônimos, sete bombeiros foram os primeiros a prestarem socorro às vítimas da tragédia em São Sebastião, mas mesmo ficando ilhados, isolados e sem comunicação, devido aos deslizamentos das encostas que atingiram a rodovia e a rede de energia e de comunicação, eles ajudaram a resgatar e a salvar muitas pessoas

 

 

Na manhã da última quarta-feira, dia 8, um grupo de sete bombeiros da Corporação de São Sebastião, recebeu uma homenagem por parte das autoridades da região. Foram homenageados o Cabo PM Antônio Borges Pinto Neto; Soldado PM Felipe Ricardo Gimenez; Cabo PM Leandro de Macedo Alves; Cabo PM Rafael da Silva Cardoso; Cabo PM Thiago Ribas de Oliveira, todos eles de São Sebastião;  o Cabo PM Marco Aurélio Braga e o soldado PM Eliezer Costa Vieira, ambos de Caraguatatuba.  Os soldados Rafael da Silva Cardoso e José de Oliveira Lima, ambos de São Paulo, o reforço de verão, não puderam comparecer a solenidade.

 

 

 

Os sete bombeiros receberam a homenagem pela atuação na tragédia de São Sebastião que resultou na morte de 64 pessoas e no desalojamento de mais de 2 mil, entre os dias 18 e 19 de fevereiro, devido as fortes chuvas que atingiram o litoral norte. Eles foram os primeiros a prestarem socorros às vítimas na costa sul sebastianense e permaneceram isolados por 48 horas na Costa Sul de São Sebastião devido à queda de barreiras na pista da rodovia Rio/Santos.

 

 

Os bombeiros prestavam serviços na corporação de São Sebastião, que fica instalada na sede do Tebar(Terminal Marítimo Almirante Barroso) no centro da cidade. Os primeiros pedidos de socorros por parte da população atingida pelas fortes chuvas chegaram por volta da meia noite e meia e não pararam mais.

 

 

Estes 7 policiais bombeiros militares, faziam parte das 3 primeiras equipes de Bombeiros que responderam aos pedidos de socorro feitos ao telefone de emergência 193, quando começou a forte chuva que atingiu a região na madrugada do dia 18 para 19 de fevereiro.

 

 

Eles foram deslocados para a costa sul, região mais atingida pelos deslizamentos entre Boiçucanga, Barra do Sahy e Juquehy. Enquanto atendiam às primeiras vítimas da chuva, novos escorregamentos de terra aconteceram, derrubando barreiras sobre a pista da rodovia Rio-Santos e destruindo outras casas na região. O escorregamento de terra também derrubou as comunicações via rádio e telefone na região, deixando-os isolados e sem qualquer comunicação.

 

Confiram dois vídeos feitos pelas equipes que iniciaram o atendimento às vítimas da tragédia:

 

 

 

 

As equipes de Bombeiros permaneceram isoladas na área atingida por 48 horas, socorrendo pessoas, auxiliando feridos e minimizando danos. Famílias, vítimas da tragédia, se solidarizaram com os bombeiros, fornecendo alimentação e água.  Apenas na noite do dia 20 de fevereiro, a pista da Rio-Santos foi liberada e as equipes conseguiram sair da área atingida.

 

Relatos da Tragédia

 

Cabo Rafael fez uma selfie com os colegas quando retornavam para São Sebastião na segunda-feira, dia 20 pela Imigrantes

 

Há 13 anos na corporação, o cabo Rafael da Silva Cardoso, de 35 anos, “nome de guerra”, Cabo Da Silva,  contou que nunca tinha passado antes por uma situação como aquela que enfrentou na madrugada do dia 18 para o dia 19 de fevereiro.

 

“Tive a sensação de ir, sem saber se iria voltar. Eu e meus colegas passamos várias situações entre a vida e a morte.  Saímos para socorrer vítimas de alagamentos em Juquehy, na costa sul. No caminho, os deslizamentos ocorriam a todo momento, muito próximos da gente…a gente ia passando e os deslizamentos iam ocorrendo… ouvíamos o barulho de  árvores se quebrando e caindo…o barulho da água descendo as encostas…ajudamos a resgatar muita gente, mas ficamos isolados e ilhados devido aos deslizamentos das encostas…”, relembra, emocionado o bombeiro.

 

Sem alimentação, sem comunicação, ele e seus colegas permaneceram ajudando as famílias ao longo da madrugada. “A gente desconhecia o que estava ocorrendo. Eu desconhecia o tamanho da tragédia, apenas quando amanheceu o dia é que percebemos o tamanho dela. Estava  tudo destruído, as encostas desceram levando tudo que tinha pela frente, estradas, casas, árvores…Foi impressionante…”, relatou.

 

Da Silva, apenas na manhã do domingo, dia 19, pode notar o tamanho da tragédia. Preocupado, quis saber como estavam sua mulher e seu filho, de apenas 3 anos, que vivem na região central de São Sebastião. Sem comunicação, passou muitas horas angustiado, até saber  que a sua família estava bem.  “Consegui emprestar um celular e entrei em contato com a família. Estavam todos bem, graças a Deus…Superamos tudo e continuamos a ajudar as vítimas da tragédia em São Sebastião, Essa é  vida de um bombeiro…”, finalizou…

 

O Cabo PM Leandro de Macedo Alves, de 38 anos, há 11 nos bombeiros, disse que já tinha atuado em um deslizamento em um morro de Santos, mas o que presenciou em São Sebastião, foi algo que jamais tinha visto. ” Foram situações impressionantes, algumas assustadoras. Poderíamos ter morrido, mas acabamos resgatando e salvando vidas. Fomos protegidos por algo superior e contamos em vários momentos com a solidariedade da população”, afirmou.

 

A equipe de Leandro, que estava como comandante de prontidão na noite de sábado, dia 18 de fevereiro, na sede da corporação no centro de São Sebastião, recebeu vários chamados e saiu para atender pessoas que estava ilhadas em Boiçucanga, na costa sul, de onde vinham a maioria dos pedidos de socorro por causa das fortes chuvas. Lá, já tinha uma equipe da operação Verão atuando , mas não consegui dar conta de tantos pedidos de socorro.

 

“Nos fomos até Boiçucanga, levamos cerca de duas horas para chegar. A situação já estava controlada pois populares ajudaram a retirar e alojar as famílias. Fomos acionados para ir até Cambury, onde dois idosos tinha sido levados pela força das águas da chuva. Quando chegamos na Praia Preta, vimos carros e três ônibus parados, devido a queda de uma barreira. Descemos da viatura e fomos avaliar a situação. Tentamos seguir a pé na escuridão até Cambury, mas a situação ficou pior. Um barulho impressionante vinha do alto das encostas, era a força da água, árvores e pedra descendo…Corremos até os carros e ônibus parados na Rio-Santos e recomendamos que deixassem o local imediatamente e retornassem para Juquehy. Assim que todos saíram, as encostas deslizaram por cerca de quase 1 quilômetro de extensão…”, contou.

 

Ele conta que somente quando clareou o dia pode avaliar a tragédia que tinha ocorrido. Sem acesso pela Rio-Santos e mesmo sem comunicação e alimentação, os bombeiros continuaram prestando atendimento na Vila Pantanal e em outros locais. No dia seguinte, segunda-feira, dia 20, deixaram a região por Santos, viajaram 300 quilômetros para retornarem até São Sebastião, percurso que levaria 40 quilômetros pela Rio-Santos, caso a rodovia não fosse interditada. No dia seguinte, terça-feira, dia 21, retornaram ao trabalho.

 

O soldado PM Eliezer Costa Vieira, de 30 anos, há 8 na corporação, lembra emocionado de  um atendimento feito em Maresias. A equipe impedia que carros subissem a serra de Boiçucanga, devido aos escorregamentos de encostas que ocorreram durante a madrugada, quando por volta das 9 horas, chega um carro vindo de Toque Toque com uma mulher que havia acabado de dar a luz em casa, com o filho. ” A mulher e a criança estavam sendo levados ao hospital de Boiçucanga, mas não tinha como, não tinha como passar pela Rio-Santos. Conseguimos acionar o helicóptero Águia da PM e mãe e filho foram removidos para a região central de São Sebastião, são e salvos”,  contou.

 

A homenagem foi realizada pelo Comando do Corpo de Bombeiros e contou com a presença do General Ferraz, do Exército Brasileiro,  responsável pela condução dos trabalhos da Operação Humanitária Interagências no Litoral Norte, do Coronel Coste do Corpo de Bombeiros – comandante da região do interior 3, do Major Fabrício, do Corpo de Bombeiros – comandante interino do 11° Grupamento de Bombeiros, entre outras autoridades.

 

A corporação também pretende homenagear outros nove bombeiros de Caraguatatuba, Ilhabela e Ubatuba, que também ficaram ilhados e isolados, por tempo menores, no atendimento as ocorrências das chuvas nos dias 18 e 19 de fevereiro. Em Ubatuba, bombeiros ficaram isolados devido a queda de barreira no bairro Rio Escuro; em Ilhabela, deslizamento próximo a Ilha das Cabras; e, em Caraguatatuba, bombeiros que ficaram ilhados quando atendiam famílias vítimas de alagamentos no Bairro Pouso Alto.

 

Tragédia

 

 

A tragédia ocorrida em São Sebastião foi a segunda maior já registrada no litoral norte paulista. Em 1967, a cidade de Caraguatatuba foi parcialmente destruída por uma tromba d’água. A cidade ficou isolada, sem água, sem energia, sem acessos e sem comunicação devido aos deslizamentos das encostas da serra do mar. Cerca de 500 pessoas perderam a vida na tragédia.

 

Em São Sebastião, a cidade recebeu entre os dias 18 e 19 de fevereiro um dos maiores volumes de chuvas já registrados no país, cerca de 626 milímetros em 24 horas, segundo informações do Centro Nacional de Previsão de Monitoramento de Desastres, Cemaden. Em 24 horas, entre 9h do sábado (18) e 9h do domingo (19), a chuva somou 626 mm em São Sebastião. A cidade teve deslizamentos de encostas em todas as regiões, principalmente, em bairros da costa sul, como Vila Sahy e Juquehy.

 

Oficialmente, a tragédia deixou 64 mortos em São Sebastião. Todos os corpos já foram identificados e liberados para o sepultamento. Levantamento da Prefeitura de São Sebastião aponta que na catástrofe de 19 de fevereiro foram contabilizadas as mortes de 23 crianças e 41 adultos, totalizando 64 vítimas. A maior parte das vítimas foi encontrada em Barra do Sahy, na Costa Sul do município.

 

Do total de crianças, 12 eram do sexo feminino e 11 do masculino. Quanto aos adultos, foram 19 mulheres e 22 homens. Com base no levantamento, 52 vítimas foram retiradas da Barra do Sahy, 10 de Juquehy e uma de Maresias, além de outra da Baleia.

 

Os dados mostram que mais da metade, 44, foi levada para enterro em outras cidades como Itapecerica da Serra, Santo André, São Paulo, Itapevi e Bertioga e Estados como Minas Gerais, Bahia, Piauí, Santa Catarina, Pernambuco e Maranhão. Em São Sebastião, foram 20 vítimas enterradas nos cemitérios do Centro, Boiçucanga e Juquehy.

 

A Defesa Civil informa que foi concluído o encaminhamento de 1096 desabrigados para pousadas e hotéis da região, sendo 860 adultos e 236 crianças. As buscas a um desaparecido no bairro da Baleia Verde seguem e são realizadas pelo Corpo de Bombeiros.

 

A Secretaria de Estado da Saúde informa que 22 adultos e seis crianças vítimas das chuvas foram atendidas, até o momento, no Hospital Regional do Litoral Norte (HRLN). Deste total, quatro permanecem internados com estado de saúde estável. Outros 19 pacientes já receberam alta hospitalar e cinco foram transferidos para outras unidades.

 

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