Para manter a preservação do acervo histórico da Fundação de Arte e Cultura de Ubatuba – Fundart – um minucioso trabalho de restauração está sendo realizado em mais de 900 obras entre quadros, esculturas, documentos e objetos diversos do acervo municipal. A previsão é que o projeto de restauração dure cerca de quatro anos para ser concluído.
Executado pela restauradora Vitória Borsatto, além da recuperação das obras, o trabalho inclui ainda pesquisas e catalogação de todo o material da Fundart e do Museu Histórico Washington de Oliveira. No total, serão restaurados 130 quadros, 200 esculturas, 305 documentos, como antigos jornais e premiações, e cerca de 300 objetos entre utilitários indígenas, máquinas de escrever, lanças, etc.
“O projeto começou em janeiro deste ano. O acervo inteiro foi analisado e catalogado conforme a necessidade de restauração. O que precisa ser apenas conservado, será limpo e guardado adequadamente, e o que precisa de restauro faremos o trabalho por etapas. Mais pra frente será feita uma mostra para que o público possa conferir todo o material”, explicou Vitória.
De acordo com a restauradora, o acervo da Fundação pode ser considerado até em bom estado de conservação, mas a umidade da cidade é um fator que exige atenção redobrada com as obras. “O lema da minha profissão é ‘conservar para não restaurar’. Mesmo enfrentando o problema da grande umidade do município, por ficarmos entre a serra e o mar, e também as altas temperaturas durante o verão, é possível realizar um trabalho eficiente de conservação nas obras atuais que amenizará a necessidade de restauração futura”.
Com o trabalho realizado atualmente no acervo, a expectativa da Fundart é de que as obras, documentos e objetos resistam por mais de 100 anos sem retoques. “Os materiais de restauração são mais meticulosos e duráveis, com alta modernização e verniz especial que garante mais durabilidade. As obras dos novos artistas também serão o futuro e precisam ser preservadas desde agora, com o processo de conservação do que temos aqui e restauração do que temos desde as décadas passadas”, ressaltou a profissional.
O trabalho é detalhista, sempre respeitando a estética e o artista, e ainda exige uma infinidade de pesquisas para conhecimento mais profundo sobre as obras. Entre os trabalhos mais antigos, a restauradora destaca um quadro de 1940, de autoria de J.B Tobias, que contém uma índia que chegou a ser apagada da obra por estar nua e que será restaurada para sua versão original. “É um quadro histórico retratando o dia da Paz de Iperoig, com o padre José de Anchieta escrevendo na praia ao redor dos índios e com uma índia apagada ao fundo. Este é o documento ocular mais antigo que temos desse acontecimento”, explicou Vitória, que também trabalha para restaurar a moldura original do quadro, que receberá detalhes em ouro.
Ao ser perguntada sobre o material do acervo que ela classifica como o mais impressionante, Vitória destaca um crânio pré-histórico, masculino, de cerca de uns 30 anos de idade, que foi encontrado no município. “Esse crânio me impressiona. Foi achado no município e feito análises arqueológicas, documentado e se encontra guardado aqui no acervo do museu. Acredita-se que foi um nativo que habitou a cidade antes dos portugueses chegarem. Foi encontrado com ele estacas, lanças de rocha e outros objetos que foram catalogados e estão aqui para serem restaurados”.
Mais do que um trabalho de restauração das obras, o projeto contribui com a valorização da história da cidade e manutenção da cultura local. “Este é um importante projeto da Fundart que visa recuperar e preservar o patrimônio histórico e cultural dos moradores de Ubatuba. Não é só o visual ou a estética das obras que restauramos, é também a história. Um povo sem história é um povo sem memória, e o trabalho do restaurador é preservar essa história para ser contada aos nossos filhos, sobrinhos e netos futuramente. Todo o acervo da Fundação é a própria identidade do público da cidade, e que também pode ajudar na valorização do turismo municipal”, disse a restauradora, que falou ainda sobre a importância do projeto.
“Este é um trabalho gratificante, porque cientificamente falando, o acervo de Ubatuba é muito rico para estudo. É uma riqueza cultural que abrange comunidades caiçaras, indígenas e quilombolas. É muita cultura dentro de um só lugar e que merece ser preservada, restaurada e entregue ao público para que todos possam saber o que se passa na cidade”, finalizou Vitória.