Conselho municipal decide tombamento de fazenda em Caraguatatuba

O Conselho Municipal de Política Cultural de Caraguatatuba se reúne, às 18 horas, amanhã,  segunda-feira (21), para discutir o tombamento da Fazenda dos Ingleses. A reunião será virtual pelo Google Meet, com transmissão pelo Facebook.

O pedido de tombamento, como patrimônio material do município, foi feito em dezembro do ano passado, ao conselho. A Secretaria Municipal de Urbanismo e a Fundação Cultural e Educação de Caraguatatuba (Fundacc), foram notificadas para as devidas providências de fiscalização e fomento.

O processo abrange tanto as edificações localizadas na Fazenda Serramar, no Jardim Britânia, quanto as situadas no bairro do Porto Novo.

A delimitação do setor da Serramar deu-se pelo chamado ‘Castelinho’ (morro na estrada da Serramar) e pelo alinhamento de edificações que ficam à margem de acesso local.

O setor do Porto Novo deu-se pelos limites de domínio atuais bem definidos pelas marinas e arruamentos vizinhos, pelo rio Juqueriquerê e pela escola estadual Avelino Ferreira.

O pedido foi justificado pela importância histórica, memorial e afetiva relacionada às trajetórias econômicas, urbanas e sociais de Caraguatatuba e região. Bem como das potencialidades educacionais, artísticas e econômicas do uso adequado destes testemunhos, em especial no turismo, lazer, habitação e equipamentos culturais e artísticos. O objetivo da iniciativa também é proteger o território do risco de perda definitiva destes patrimônios, pelo abandono, arruinamento e impactos deliberados que possam existir.

O pedido está amparado pela Lei Municipal 2.484, de 27 de Junho de 2019, e pela Resolução CMPCC 04 de 14 de dezembro de 2021. A Resolução dispõe que já a partir do protocolo fica assegurado preliminarmente a proteção, até a decisão definitiva do conselho.

Memória

A Fazenda dos Ingleses começou suas atividades em 1927 com o nome de Fazenda São Sebastião. Caraguatatuba era praticamente uma vila, com cerca de 3 mil habitantes e, pertencia ao distrito de São Sebastião. A Fazenda dos Ingleses, que tinha 4.020 alqueires, pertencia a empresa The Lancashire General Investment Company, do grupo Vestey, que tinha sede em Londres. Logo depois, a fazenda foi arrendada para a Companhia Brasileira de Frutas, uma de suas subsidiárias. Alguns anos depois, o empreendimento foi vendido para o Frigorífico Anglo, também de propriedade da Lancashire.

 

A Fazenda tinha uma rede ferroviária interna, que chegou a atingir 120 quilômetros de extensão, construída sob a administração do engenheiro Fuank Robotton, com a ajuda de 80 práticos portugueses contratados, principalmente, em Santos e no Rio de Janeiro. Esta ferrovia era necessária porque no auge da colheita, a composição ferroviária utilizava de 10 a 12 máquinas movidas a óleo e gasolina, além de 200 vagões, incluindo caçambas para o transporte de terra, plataformas para movimentação de madeiras e vagões para o transporte de mercadorias destinadas aos armazéns da Fazenda.

 

O transporte interno dos operários e suas famílias era feito através de um carrinho de inspeção, que circulava sobre os trilhos. Toda a produção era escoada para o cais particular, situado no Porto Novo, de onde se fazia o transporte até o Canal de São Sebastião. Os ingleses tentaram explorar tudo o que era possível: pimenta, banana, laranja, café, milho e, até mesmo, madeira para construção de estradas de ferro na Europa, durante a guerra. Viviam na fazenda cerca de 4 mil pessoas. Era uma “ cidade” dentro de uma “cidade”.

 

Além da banana, uma das produções mais importantes era a laranja “grape fruit”, a preferida da realeza inglesa. Os ingleses tentaram ainda a produção de cachaça, fabricaram duas delas bastante conhecidas, Sítio Velho e Anhimbu, que infelizmente, deixaram de ser produzida, segundo consta, porque o responsável pela produção, um brasileiro, veio a falecer.

 

Os ingleses se davam bem com os brasileiros. Na fazenda tinha cinema, campo de golfe, de futebol, de tênis e prática do polo. O futebol era o esporte preferido aos domingos. O sábado era dia de “açougue”, comerciantes vendiam carne e vários mascates vendiam seus produtos- roupas, utensílios domésticos, diretamente aos moradores brasileiros. Para as mulheres, as missas de domingo e as festas católicas eram os dias mais alegres.

 

Três fatos marcaram muito a vida na fazenda: o assassinato do inglês D. R. Batchelar, um dos administradores por um dos funcionários; a tentativa de invasão de uma área da fazenda por pessoas que não tinham onde morar; e, um motim dos operários, em 1932, na tentativa de obter melhores condições salariais.

 

 

A fazenda dos Ingleses mudou radicalmente a economia de Caraguá e do Litoral Norte. Gente de todo o canto do Vale do Paraíba e da capital vinha para a cidade em busca de emprego.  A Fazenda dos Ingleses foi o principal fator de desenvolvimento da cidade até a chegada dos turistas. Era uma das três maiores do gênero na América do Sul. Por volta de 1946, no final da II Guerra Mundial, a fazenda retomou a produção de cítricos, voltando ao mercado inglês e sobreviveu mais 20 anos dessa cultura, mas não resistiu ao declínio do mercado europeu de frutas, gerando grande prejuízo a empresa.

 

 

Com a catástrofe de 1967, metade da fazenda ficou debaixo da lama. A Fazenda dos Ingleses foi aos poucos ficando abandonada. Em 1971, a Pecuária Serramar adquiriu as terras e instalou um projeto pecuário no mesmo local. A atividade foi então paralisada muitos anos depois. Hoje, a família Penido, dona da área, mantém, em parte dela, uma criação de gado e um shopping center.

 

 

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