A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) realizou, ontem, quinta-feira (2), uma audiência pública para discutir o Projeto de Lei Complementar 41/2021, que municipaliza a gestão da Área de Preservação Ambiental (APA) de Tamoios, localizada na cidade de Angra dos Reis (RJ).
Além de transferir para o município a gestão desta unidade de conservação, hoje executada pelo Governo do Estado, o projeto também prevê a revisão dos planos de manejo de todas as áreas protegidas dos municípios da região da Costa Verde, no litoral fluminense.
O projeto, protocolado na ALERJ em setembro passado, tem provocado forte reação contrária de organizações da sociedade civil da região. Elas reclamam, principalmente, da falta de diálogo.
O presidente do Inea, Philipe Campello, defendeu a solução de uma gestão compartilhada: “Em municípios que há gestão compartilhada entre União, estado e municípios tivemos resultados muito exitosos”, comentou.
O deputado Carlos Minc (PSB) defendeu o fortalecimento do Inea, e apontou que o projeto irá beneficiar a especulação imobiliária. “Uma cogestão para fiscalizar mais é sempre bem-vinda. Quando fizemos a duplicação do Parque Estadual da Ilha Grande, sete resorts já estavam prontos para se instalarem na praia de Lopes Mendes”, disse.
O deputado Flávio Serafini (PSol), por sua vez, salientou que a área em questão é um patrimônio mundial pela biodiversidade ecológica e cultural. “Se querem a municipalização, que apresentem uma proposta concreta”, declarou.
Segundo Davi Paiva, membro da Coordenação Nacional dos Povos Tradicionais Caiçaras (CNPTC) e do Fórum de Comunidades Tradicionais de Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba, ” a proposta de municipalização da Área de Proteção Ambiental de Tamoios e demais Unidades de Conservação só interessa aos políticos que hoje governam a região servindo aos interesses da especulação imobiliária. Assim como foi com a abertura da estrada Rio-Santos, na década de 1970, mais uma vez estão negando aos povos tradicionais o direito de consulta prévia, impondo de forma arbitrária ao território mudanças importantes que vão transformar a vida das próximas gerações”.
Como justificativa para a municipalização da APA de Tamoios, o Projeto de Lei Complementar argumenta que a existência da unidade de conservação restringe o desenvolvimento local. A proposta estabelece que o Plano de Manejo da área se adapte ao plano diretor de Angra, à lei de uso do solo e outras regras do município, a fim de proporcionar o alegado desenvolvimento da região.
“Flexibilizar e fragilizar a legislação ambiental nesse momento é voltar num tempo cada vez mais presente no qual as grilagens de terra destroem o que restou de comunidades tradicionais, dando lugar a novos condomínios de luxo e privatizando ainda mais as praias da região”, complementa Davi Paiva.
O projeto é de autoria da deputada Célia Jordão (Patriota), esposa do atual prefeito de Angra, Fernando Jordão. Na audiência, Célia alegou que o projeto não acabaria com a APA. Ela ressaltou que se pretende acabar com a sobreposição de atuações: “Não se pretende municipalizar a APA, mas transferir sua gestão. Ninguém está falando em especulação imobiliária e grandes empreendimentos. A gestão municipal está mais próxima para lidar com os problemas. Foi uma situação demandada pelos representantes dos municípios da região. Sou uma municipalista. O órgão gestor da APA de Tamoios mostra ineficiência desde a criação. Os investimentos são aquém para a gestão. Os limites da APA estão integralmente dentro de Angra dos Reis. Queremos evitar sobreposição de atuação. Não queremos acabar com a APA, e sim com os conflitos existentes”.
A deputada disse que, “ninguém vai para a Costa Verde para ver concreto, e sim suas belezas naturais. E o que queremos é ampliar a preservação ambiental. O interesse de um órgão estadual não poder estar acima da população do município. No mais, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) não vai deixar de atuar. Vamos somar esforços para preservar a natureza e criar um ambiente de desenvolvimento sustentável, seja no turismo ou na pesca”.
O engenheiro e professor da Uerj, Adcato Otoni classificou o projeto como vago. Segundo ele, “a municipalização não vai resolver o problema. Temos que ter um projeto que determine uma verba mínima para o Inea aumentar a fiscalização; um projeto em que se valorize a preservação da biodiversidade, que é o que vai atrair turista, gerar emprego e desenvolver a região”.
Apesar da pressão popular, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), deputado Márcio Pacheco (PSC), afastou a chance de a proposta deixar de tramitar na Alerj. “Como presidente da CCJ, entendo que é relevante que o projeto seja discutido no plenário e votado pelos parlamentares. De maneira alguma, será arquivado ou retirado de pauta. Tem meu apoio para que ande”, disse Pacheco.
A APA de Tamoios abrange uma extensão de 22.530 hectares em áreas continentais e insulares, compreendendo complexos contextos ambientais, sociais, econômicos e culturais. Criada há 40 anos para proteger a fauna e flora da região, a unidade alcança 70 ilhas, das quais 56 seriam impactadas pelo projeto proposto. *com informações do site Eco e Alerj